ERA na FIV: por que não é a “chave perdida” da implantação — e o que realmente ajuda

Se você passou por uma transferência e o embrião não implantou, a frustração é gigante. Nesse momento, muitas pessoas ouvem falar do ERA (Endometrial Receptivity Array) como se ele “alinhasse a janela de implantação” e resolvesse o problema. A boa ciência, porém, não confirma esse benefício. Vamos direto ao ponto, de forma clara.

O que o ERA promete — e o que os estudos mostram

O que é: o ERA analisa a expressão de centenas de genes do endométrio para “datá-lo” e orientar um pET (personalized embryo transfer), ajustando o dia da transferência à suposta “janela de implantação”.

O que a evidência mostra até agora:

Estudo multicêntrico (2022, >5.000 transferências): após uma falha prévia, usar o ERA para guiar pET esteve associado a piores desfechos do que seguir o timing padrão, tanto em ciclos autólogos quanto com óvulos doados — inclusive com embriões euploides. As taxas de nascido vivo por transferência e cumulativa foram menores no grupo guiado por ERA. Conclusão dos autores: o ERA não melhorou os resultados; ao contrário, houve piora.

Cohort retrospectivo em RIF (2020): em falha de implantação recorrente moderada ou severa, o ERA não melhorou taxa de implantação nem de gestação em andamento. Os autores foram claros: “no estágio atual de desenvolvimento, o ERA não parece clinicamente útil para RIF.”

Recomendações sobre “add-ons” (2025, Human Reproduction): documentos de boas práticas reforçam que testes de receptividade endometrial não são indicados de forma universal, e a maioria dos “add-ons” deve ser evitada na rotina pela falta de benefício clínico comprovado. Se considerados, que seja caso a caso e com discussão honesta de incertezas.

Por que o ERA não entregou o que prometia?

Implantação não é só “calendário”

 A receptividade endometrial não é um botão liga/desliga; é um espectro influenciado por múltiplos fatores e pelo próprio embrião. Um euploide de alta qualidade tende a implantar em uma faixa ampla de receptividade; “microajustes” do dia nem sempre mudam o desfecho.

Desfecho que importa é nascido vivo

Alguns estudos antigos sugeriam melhora em marcadores intermediários. Quando olhamos nascido vivo por transferência e cumulativo, o ganho não aparece — e no maior estudo, piora.

Custo, atraso e invasividade

 O ERA exige biópsia e normalmente adiar a transferência, encarece o tratamento e não trouxe benefício após uma única falha de implantação.

Perguntas diretas (com respostas diretas)

O ERA é imprescindível?

Não. Não há evidência de benefício clínico para uso rotineiro; no maior estudo, os resultados foram piores com ERA.

Devo fazer ERA depois de uma única falha?

Pelo contrário: os dados avaliando essa situação não mostram vantagem e sugerem desvantagem.

E em falha recorrente de implantação (RIF)?

Mesmo em RIF, o ERA não melhorou os desfechos. Precisamos de métodos melhores para investigar fatores endometriais.

Existe algum subgrupo que possa se beneficiar?

 As revisões de “add-ons” e grupos de boas práticas sugerem que, se houver algum benefício, ele seria restrito e ainda não comprovado; é um tema de pesquisa, não de rotina.

O que fazer em vez de apostar no ERA

Priorizar embriões euploides e boa morfologia quando possível, porque a competência embrionária é o principal determinante. (O estudo de 2020 mostra benefício do PGT-A em RIF moderado, embora não em RIF severo.)

Padronizar laboratório e transferência, evitando manipulações desnecessárias e múltiplos recongelamentos (boa prática geral de implantação; não depende de ERA).

Checar o básico uterino com métodos que realmente mudam conduta (p. ex., histeroscopia quando há suspeita; triagem indiscriminada como “add-on” também não melhora LBR).

Cuidar do terreno metabólico e inflamatório (peso, sono, tabagismo, atividade física). O endométrio responde ao organismo como um todo.

Em resumo…


Você não falhou porque não fez um teste “X” no mês “Y”. A implantação é um diálogo complexo entre embrião e endométrio. Os dados mais sólidos até agora não colocam o ERA como solução — e, em cenários comuns, desaconselham seu uso. Nosso foco deve estar no que comprovadamente aumenta suas chances ao longo do caminho, com informação honesta e decisões que realmente mudam o desfecho.

📖 Referências Científicas:
Cozzolino M. et al. 2022. pET guiado por ERA após uma falha: pior LBR e CLBR vs. timing padrão, inclusive com euploides e em ciclos com doadoras.

Cozzolino M. et al. 2020. RIF moderado/severo: ERA não melhora resultados; não clinicamente útil no estágio atual.

Serdarogullari M. et al. 2025 (Human Reproduction). Add-ons em MAR: testes de receptividade não são indicados universalmente; uso não recomendado rotineiro; considerar caso a caso e com transparência sobre a baixa qualidade de evidência.

Add-ons in ART evidence & pract…

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